Realidade que pode ser doce também.

Março 2013

Eu a amava muito. Mas não queria nunca me declarar. Já havia se passado um mês desde o fim daquela saga contra Ar, já estava de volta ao país que estava exilado com minha identidade antiga, e o objetivo meu naquele momento era encarar aquilo que eu mais temia: o amor.

Sempre gostei de você. De longe, é claro. Mas nunca tinha tido coragem de me declarar. Bom, se eu tinha sobrevivido a tudo aquilo, era claro que eu deveria era ir lá e enfrentar meu medo, pois teoricamente não existiria nada pior.

Porque encarar quem amamos de frente? Porque atravessarmos todo aquele abismo enorme do medo, da incerteza, e chegar na pessoa em que amamos e declarar tudo o que sentimos por ela? Era mais fácil e seguro continuar nos sonhos.

Afinal nos sonhos era tudo possível. Mas o que eu encarava agora era real. Era longe de Victoire, longe "dela", longe de tudo que era temporário, incerto. Tudo o que buscava era uma vida nova. Uma vida ao lado de uma grande mulher. Acima de tudo uma mulher que me amasse. E eu tinha que encarar. Encarar o medo de levar um fora, mas encarar o desafio de também seguir em frente no amor. Afinal aquilo era uma escolha, e eu deveria estar ciente das consequências dele, independente de qualquer que fosse.

"Eu sei que isso tudo é difícil de dizer. E sei que somos apenas amigos, e que é difícil olhar para um amigo do mesmo jeito que se olha pra um namorado. Mas, quer saber? Não vejo motivos para que não aconteça nada entre a gente. Eu também colocava muitos impedimentos na frente, achava que entre nós nada daria certo, mas pensando hoje resolvi aceitar", eu disse.

"Aceitar?", ela disse.

"Sim, aceitar. Aceitar que não vai ser fácil. Aceitar que vai ser difícil. Aceitar que terei que lutar, mas acima de tudo, eu quero lutar. Quero que você me dê uma chance. Quero sair desse mundo de sonhos que tenho com você e encarar a realidade, incluindo a possibilidade de levar um fora. Mas acima de tudo o que me move é esperança. Tenho esperança que tudo será superado, que terei uma chance de te fazer feliz, por isso venho aqui te dizer com todas as palavras que encararia tudo o que está na minha frente. Encararia porque eu te amo com todas as minhas forças, e quero ser mais que um amigo pra você".

Ela no começo não sabia o que falar. Olhava pra baixo, pensativa. De fato, estava surpresa. Foram apenas segundos, mas foram os segundos mais longos da minha vida. Ela olhou pra mim e sorriu. Seus olhos brilhavam, parecia que toda aquela névoa de dúvidas e incertezas havia sumido.

"Eu tenho medo, e se não der certo?", ela disse.

"Eu também tenho medo. Mas estou determinado a enfrentar isso tudo. Entenda que eu não quero mais sonhar. Eu quero a realidade! Não quero te ver num sonho e ao acordar não te ver mais. O que quero é acordar e ver você ao meu lado", eu disse.

Mas antes que eu começasse uma outra frase ela silenciosamente aproximou-se de mim, seu rosto indo ao meu encontro e eu a beijei. Embora nosso primeiro beijo tivesse um pouco aroma do café da manhã que havíamos comido, foi o melhor beijo que eu poderia ter recebido. Seus lábios eram macios como eu nunca havia imaginado, nossas bocas iam se tocando delicadamente, e ela colocou a mão sobre a minha nuca, enquanto movia a cabeça pro outro lado.

Naquele momento meu coração batia forte. Era o amor. Era o primeiro passo para deixar aquela vida na Inteligência e ter enfim uma vida comum. Sem pessoas atrás de mim, sem pessoas para prender, sem ser uma mera ferramenta do governo ou de quem que seja.

Nunca agradeci tanto à velha por ter me dado essa possibilidade. Era apenas o primeiro beijo, mas era tão bom. Uma sensação tão boa que era como estar ao lado dela: tava vontade de nunca mais sair de lá. De sempre estar de mãos dadas com ela, de volta e meia roubar (e ser roubado) um beijo. De usar aquele tempo que tínhamos, mesmo que fosse pouco, que fosse eterno enquanto durasse.

Óbvio que a realidade também trazia lá seus problemas. Em dois meses tivemos nossa primeira briga. Foi algo fútil tinha a ver com uma viagem. Naquele momento vi que talvez algumas coisas não seriam tão fáceis como esperava. Mas ainda assim valia a pena. Fizemos as pazes, brigamos, tivemos nossos momentos de tristeza e tivemos que dar um ombro amigo ao outro. Aquilo era ser um casal. Aquilo era amor. Aquilo era ser parceiro de alguém como eu nunca havia experimentado na vida.

Todas as noites que nós nos deitávamos juntos era sempre a coisa mais bonita do mundo. O corpo dela, pequeno, frágil aparentemente me dominava todo na cama. O êxtase era intenso, sentia nosso corpo se tornando um, nós dois nos fundindo em um só. Sentia a energia toda, um calor cheio de ternura dentro de mim, que se conectava a ela, enquanto ela nua jogava seus braços em mim, me abraçando, enquanto eu estava por cima dela.

Realmente imaginava que ela, pela sua aparência, fosse mais... Recatada. Mas não. Era uma mulher e tanto. Aquilo que tantas pessoas transformavam em algo vil e impuro, era sempre regado a muitos beijos, carícias e, porque não, risadas? Era divertido e prazeroso estar nesses momentos com ela, afinal éramos dois grandes brincalhões. Pois naquele momento eu estava realizando aquele sonho maior que eu tinha: namorar alguém que eu tinha como amiga.

Todas essas memórias permaneceram no meu coração gravadas. Aquilo não parecia realidade. Parece que depois de tantos anos em busca, enfim havia encontrado uma mulher pra andar ao meu lado, pra ser minha parceira. A vida parecia enfim estar sorrindo pra mim, e se aquilo fosse um sonho, jamais eu queria acordar, afinal nem tinha como. Aquilo era real, com seus altos e baixos, mas acima de tudo, era amor.

Amor, pois eu a havia aceitado, tanto nos pontos positivos quanto negativos.

Você vai saber que está amando alguém quando mesmo que depois que você saber dos defeitos da pessoa, vai aceitar mesmo assim e querer ficar ao lado dela.

Eu amava.

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